Discorrerei nesse breve relato mais sobre a manifestação popular intitulada "Pássaro Junino"
Desenvolvi de 2010 para 2011 uma iniciação ciêntifica (PIBIC FAPEMIG) orientado pela professora Dr. Maria do Perpétuo Socorro Calixto Marques que analisamos o espaço mitologico da dramaturgia "O Pássaro da Terra" de João de Jesus Paes Loureiro. O artigo final intitulado "Mito
e Melodrama em O pássaro da Terra, de
João de Jesus Paes Loureiro" tinha como resumo:
"O
objetivo desse artigo é apresentar um estudo sobre a peça teatral O pássaro da terra, do dramaturgo paraense João de Jesus Paes
Loureiro. A análise prioriza a relação entre
mitologia e razão na organização das personagens e sua correspondência com
uma das manifestações populares do Pará, o Pássaro Junino, na qual o autor
inspirou-se para escrever a obra. Além, disso apresentaremos os diálogos que a
peça mantém com outras formas teatrais, a exemplo da estética melodramática e
da tragédia grega. Como suporte teórico, serviremo-nos de reflexões teóricas
que atendam à organização do texto, como estudos sobre estéticas dramáticas, a organização
do melodrama e da tragédia grega, mito e história sobre a Amazônia.
Palavras:Chave:
Discurso; Melodrama; Pássaro Junino; Tragédia. "
Pude identificar nas análises leituras e re-atualizações de elementos da tragédia grega e do melodrama, mas é de outro tipo teatral que ele assume sua inspiração: o pássaro junino, também conhecido como pássaro do melodrama fantasia, que é “uma forma de espetáculo que, em seu desenho final, é um conjunto de várias linguagens, que constituem a originalidade dos pássaros juninos de Belém do Pará. (MOURA, 1997, p. 52). Esse tipo teatral paraense tem como uma de suas origens, outras personagens locais como o boi-bumbá, manifestação popular onde há a presença da cobiça, morte e ressurreição do animal, presença de índios, matutos e do amo. Há o cordão de bichos e o cordão de pássaros e também um animal, real ou lendário de algum amo, rei ou rainha, que é morto e, graças à medicina ou meios sobrenaturais, revive. Essas representações ocorrem de acordo com o binômio morte-ressurreição. Também há apresentações de teatros populares religiosos, culminando assim, como dito anteriormente por Moura ( Op.Cit.), em um conjunto de linguagens.
O pássaro junino tradicional possui uma estrutura própria para suas representações, assim como o melodrama: a história sempre gira sem torno de um pássaro, que é querido por uma princesa, cobiçado por um caçador, que o mata a tiros de espingarda ou por meio da baladeira (Nome que se dá ao estilingue nas regiões do Norte e Nordeste), e toda sua ação tem o aval de uma feiticeira. Com a morte da ave, uma boa fada, um pajé ou até mesmo uma cigana, o ressuscitam e o no final o caçador e a feiticeira são punidos e a paz volta a ser como antes. Essa é a estrutura básica, e já de inicio observamos que o autor João de Jesus, de fato inspirava-se nesse estilo, assim como também nas estruturas das tragédias gregas e do melodrama, sem tornar-se refém de nenhum estilo, e sim os utilizando para criar uma obra única.
No Pássaro da Terra, a ação desenrola-se, como já colocado, em volta do pássaro, amado por uma mulher que, no caso é a Donzela, moça da cidade grande que está de férias no campo. A feiticeira, que na estrutura original, vê com bom olhos a morte do pássaro, está aqui representada, de certa forma, pelo Duque de Além Mar, pai da Donzela, que contrata um caçador para matá-lo, pois acredita que só com a morte dele é que poderá conquistar todas as terras por ali. Ao final da obra, a tragédia toma conta com a morte do pássaro, e também com a de Donzela, e nenhum ser fantástico ou do universo do humano intervêm para ressuscitá-los. No livro O teatro que o povo cria, o estudioso Carlos Eugênio Marcondes de Moura, diz:
O assalto ao pássaro, em algumas comédias, deixa de ser mera exteriorização de violência e cobiça para tornar-se um atentado contra o equilíbrio da natureza. A devastação do meio ambiente, a que vem sendo submetida a Amazônica, bem como sua denúncia, despertam ou aguçam a consciência de suas populações e esta preocupação, vivamente sentida, acaba por se fazer presente na temática (MOURA, 1997: p.166)
Esse discurso protecionista à Amazônia não era regra nos espetáculos do pássaro junino, mas, é uma questão muito forte e presente na obra de Loureiro.
Acreditamos que o autor, mesmo não recorrendo a um ser fantástico para ressuscitar o pássaro, ou até mesmo a Donzela, como uma forma de fortificar seu discurso em prol da natureza, faz uso de uma estratégia para dizer que, indiretamente, os gananciosos como o Duque D‟ Além Mar, os destruidores da floresta serão punidos.
Como dito acima, o pássaro junino é também conhecido como pássaro melodrama fantasia, pois, esse estilo acaba por re-atualizar muitas das características do melodrama:
A criação de uma nova dramaturgia, que recorre ao melodrama e muitas de suas convenções, implica no abandona das singelas estruturas narrativas do cordão de pássaros e do cordão de bichos. O tema central do cordão – caçada ou roubo, ferimento ou morte, recuperação ou ressurreição do animal – dilui-se cada vez mais no conjunto das tramas e sub-tramas elaboradas pelos autores, que propõem novas temáticas, próprias do melodrama clássico e romântico (desencontros amorosos, luxúria, cobiça por bens materiais; os embates do bem com o mal; a sacralização da natureza). (MOURA, 1997, p. 108)
Assim sendo, a estrutura da obra sendo um pouco mais complexa do que as estruturas formais do pássaro junino tradicional, ainda dialoga com essa manifestação paraense. São exemplos, o aparecimento de sub-tramas na obra, concomitante à caçada do pássaro, a presença do Posseiro e de Índios que, expulsos de suas terras, foram à procura de justiça; o surgimento de temáticas como o desencontro amoroso entre a
Donzela e o Caçador, pois ambos acreditam que ao final ficariam juntos; a cobiça por bens materiais, que acaba por nortear o texto, os embates entre bem e mal, sendo este último representado pela figura do Duque D‟Além Mar; a sacralização da natureza, pois é exatamente este discurso que o autor imprime durante toda a sua dramaturgia, ao tentar mostrar o quão sagrada e frágil é a mesma. Ainda sobre as características melodramáticas reescritas pelos autores juninos, Moura prossegue:
Sua lógica, sua progressão dramática, são interrompidas por entradas de personagens, que muitos exemplos, intervêm apenas com a intenção de distrair a atenção do publico, fazendo-o desligar-se, por alguns instantes, do opressivo clima instaurado pelas peripécias do melodrama. É o caso dos matutos e dos números de dança, designados como baile e há pouco se mencionou quanto essa intervenção se assemelha à estrutura clássica do teatro de revista (MOURA, 1997, p. 108)
A presença dessas personagens cômicas, que vêem atenuar a tensão dada aos textos está presente exatamente no percurso em que a obra está em direção ao seu clímax – a morte dos heróis e o reconhecimento do percurso trágico. O elemento cômico – também presente nas estruturas melodramáticas clássicas – ocorre por meio das personagens Mestre Jaques e Compadre Ramos, que aparecem somente e unicamente na Cena VII, de passagem pela região, por meio de sua igarité (Tipo de canoa regional.). Eles bebem, cantam, dançam, lundu (Dança de par solto, de origem africana, que teve seu esplendor no Brasil em fins do séc. XVIII e começos do séc. XIX.) e satirizam costumes e seres da região.
Essa é copilação de uma parte do artigo, por isso, qualquer dúvida e mais sobre vamos conversando nas aulas.
Bibliografia
LOUREIRO, João de Jesus Paes. O Pássaro da Terra. Escrituras, São Paulo: 2003.
________. Obras reunidas, teatro e ensaios. São Paulo: Escrituras, 2001.
MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de Moura. O teatro que o povo cria: cordão de pássaros, cordão de bichos, pássaros juninos do Pará: da dramaturgia ao espetáculo. Belém: Secult, 1997.